Por Elson de Melo
Querido Pai Raimundo de Lima Pinto, é tempo de Natal, época em que as famílias se juntam para celebrar o nascimento do Menino Jesus, movido por este momento, estou escrevendo estás poucas linhas para agradecer você por ter possibilitado minha passagem por este mundo e ter você como pai, amigo, companheiro e acima de tudo, meu maior exemplo de cidadão comprometido com a vida e a solidariedade.
Foi com você Pai, que aprendi o sentido de coletividade, desde criança, acompanho com atenção e entusiasmo, sua luta por um mundo mais justo, fraterno e igual para todos. Você é um homem de espírito e fé muito forte, durante todos esses anos de convivência, nunca testemunhei o senhor movido por sentimentos pequenos como raiva, ódio ou omissão, reclamar da vida, jamais!
Contava meu avô Messias, que quando o Senhor se casou com a mamãe Elzira, você era um jovem entusiasmado com o futuro, cortou lenha para vender aos vapores que seguiam rio acima e rio abaixo, transportando mercadorias e borracha, plantou juta, criou gado, pescou, cultivou roça de mandioca, banal e construiu o mais lindo Cacoal que meus olhos já viram.
Sabe Pai, as vezes me pego relembrando o dia que o Senhor chegou feliz da vida pilotando sozinho o seu primeiro barco, eu já rapazinho, corri para o porto junto com meus irmãos para ver você ancorar o nosso Charmoso! Quanta felicidade foi aquele momento. Era a compensação pela tristeza que tínhamos sofrido quando foram vendidas as vacas Cara Branca, Malhadinha, Mingota, Araçá, Vermelhona e boi Brabinho para comprar o barco. Há como eu tenho saudade de quando chegávamos a qualquer lugar e ouvir as pessoas exclamarem. Chegaram os filhos do Lima!
O Senhor é canhoto, não conseguiu ser um craque na bola, mas foi um craque na arte de incentivar os jovens a praticarem esporte, não mediu esforços para construir diversos campos de futebol na nossa querida comunidade do Novo Amazonas, que tu fundaste. Há Pai, como você pensou tudo, não tinha escola, você articulou a construção da escola, não tinha Professor, você articulou o Professor.
Pai, você é um homem apaixonado pela Varzea, quando todos fugiam das grandes enchentes, o senhor estava lá, desafiando as águas, fazendo maromba para o gado, cortando canarana para alimentá-los. Na cheia de 1953 eu ainda não existia, mas, o senhor construiu uma casa projetando o assoalho para um nível acima da marca que ela deixou que casa linda, assoalhada com tabuas de maçaranduba, era um espelho, foi o senhor que tirou todo o maderame no machado, quase decepa o se pé com um golpe de machado, que verdadeira aventura, pena que a terra ruiu e tivemos que demolir a casa.
Posso sem medo de errar afirmar, conheci na vida um casal perfeito! Esse casal é o Senhor e a Mamãe, não pelo fato de serem meus pais, mas sim por vocês serem um casal que se completavam plenamente, combinava em tudo, o Senhor organizador da Comunidade, Ela prestando todo apoio organizando as mulheres no Clube de Mães, o Senhor Catequista, Acolito, Ela organizando as recreações para as crianças. Foi a partir dessa sua pratica, que acabei envolvido nas lutas sociais que um dia alguém haverá de narrar essa história.
Raimundo de Lima Pinto, caboclo de Urucurituba, fundador e morador da Comunidade Novo Amazonas, pai de nove filhos: Tereza, Adilson, Gilson, Edson, Elson, Ironilson, Dinilson, Jackson e Fátima. Eis um homem Amazônico que apesar de suas limitações e das dificuldades de comunicação com mundo, foi um dos percussores do Cooperativismo no Amazonas, fundou uma das primeiras Cooperativas do Estado, foi a Cooperativa Agrícola Mista do Novo Amazonas, por conta dessa ousadia, os comerciantes da região os acusaram de comunista, lembro que através de muitos Puxiruns os cooperados conseguiram erguer a sede da Cooperativa, foi ali que funcionou por muito tempo a escola da Comunidade, também serviu de local para a celebração dos cultos ou missas e as festas, era o nosso Centro Social.
Pai, nossa viagem não termina aqui, sua história precisa de uma narrativa mais detalhada, seus pensamentos precisam ser compartilhados, sua vontade precisa ser concretizada. Todos os seus empreendimentos foram sempre no sentido coletivo, vou dar mais um exemplo: a Colônia, embora o senhor não fosse um entusiasta de viver nas terras firmes, não pensou duas vezes para junto com seus companheiros, adquirirem um terreno lá no lago do Carará Município de Urucará, para fundarem a Colônia Agrícola, veja pai o Senhor é na verdade um grande empreendedor social!
Pai será que o Senhor tem algum defeito! Lógico que sim, afinal o senhor é humano, Mamãe dizia que um dos seus grandes defeitos é ser bom demais. Ele explicava dizendo; “as pessoas se aproveitam da bondade do Raimundo, para sempre levarem vantagem sobre Ele”, acho que Mamãe tinha razão, sobre isso, lembro que o Senhor tentou ser um comerciante, montou uma espécie de armazém e passou a comercializar gêneros alimentícios e utilidades, não durou um ano, um dia por curiosidade foi dar uma olhada naquele velho borrador onde o Senhor anotava as compras fiadas dos seus clientes, verifiquei que toda a mercadoria foi vendida fiada e seus clientes nunca pagaram! Acho que o Senhor também nunca cobrou. É Pai, como pode a bondade ser um dos seus defeitos. Não fique triste, considere sempre que a bondade é e será a qualquer tempo, uma grande virtude.
Como disse antes, nossa viagem não termina aqui, vou fazer uma breve atracação para celebrarmos juntos o Natal e a chegada do Novo Ano, desejo que nossas vidas se prolonguem por mito tempo, para continuarmos essa caminhada cujo destino é a prosperidade na terra e um lugar privilegiado ao lado de Deus quando Ele nos chamar. Parabéns Pai por você existir e resistir os percalços que a vida lhe impôs, desejo nesse momento um pronto restabelecimento, mantenha viva a sua fé, pois ele é capaz de remover montanhas, seja onde for estaremos sempre juntos! Feliz Natal grande Pai.
Raimundo Elson de Melo Pinto – Seu Filho
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