Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal
de Pernambuco
Sem transparência, sem debate, com a arrogância e prepotência que
é a marca registrada de dirigentes do setor elétrico e, principalmente, sem um
diagnóstico amplo sobre as reais razões da explosão tarifária ocorrida nos
últimos anos.
Assim foi imposta uma estratégia para reduzir o custo da energia
para o consumidor final, a partir das regras contidas na MP 579.
O uso da redução da tarifa como um instrumento de política pública
para a renovação das concessões no setor elétrico foi o caminho encontrado pelos
sábios. Os mesmos que levaram as tarifas elétricas a alcançarem patamares
extorsivos para a economia brasileira.
Criticar a MP 579 e seus "filhotes" (portarias 578, 579,
580, 591 e o decreto 7.850) não é ter posição contra a redução das tarifas de
energia elétrica, que é um clamor nacional.
Ao contrário, é denunciar que, mais uma vez, as nossas empresas
públicas do setor elétrico serão usadas para objetivos fora de sua competência,
como tem ocorrido tradicionalmente.
Elas serão colocadas em risco em nome da política de redução de
preço da energia.
O que se tenta evitar é chegar a uma situação indesejável para
toda a sociedade: o comprometimento da qualidade na prestação do serviço
elétrico, causado pela redução drástica do faturamento das empresas estatais,
verdadeiro patrimônio do povo brasileiro, levando-as ao sucateamento. Sem
dúvida a empresa mais afetada foi a Eletrobrás, estatal federal, cuja diretoria
não entrou em polêmicas públicas com sua controladora, a União.
Vários setores da sociedade criticaram o método, o conteúdo, e a
oportunidade da edição da MP 579 (véspera da eleição municipal).
Determinar a fixação das tarifas de geração pela Agência Nacional
de Energia Elétrica (Aneel) é preocupante. É exatamente ela que foi e é
responsável por definir as tarifas de distribuição, que tanto têm onerado os
consumidores.
A questão energética está sendo decidida de forma autoritária por
um número reduzido de pessoas, levando a duvidar sobre a capacidade e isenção
de se formular e executar uma política energética que vise os interesses do
povo brasileiro.
A energia elétrica é estratégica para o país, não pode
simplesmente ficar nas mãos de economistas e advogados. Os engenheiros e
técnicos do setor, assim como a sociedade, tem de participar, opinar.
Eles apontariam os riscos da medida atual: o que está sendo
imposto levará ao corte significativo de receitas das empresas, em alguns casos
de até 80%, o que certamente acarretará na perda da qualidade do sistema
elétrico e do conhecimento técnico adquirido por décadas --sem dúvida, haverá
corte de pessoal para conter despesas.
E o pior é que a prorrogação das concessões não mudará em nada o
custo da energia no Brasil. Os aumentos previstos nos próximos anos vão
absorver toda a redução da tarifa obtida com a medida provisória.
Positivamente, alguns encargos serão extintos, mas isso não
interferirá no ponto nevrálgico que tem garantido os elevados custos da
energia: os contratos draconianos feitos desde os anos 1990, permitindo
retornos e lucros exorbitantes para algumas empresas --em particular as
distribuidoras.
Não adianta somente impor tarifas menores na geração sem mexer na
distribuição, cujas empresas ano após ano, depois da privatização, têm
apresentado nos seus balanços contábeis lucros extraordinários para a realidade
brasileira.
É imperativo que prevaleça no setor elétrico um modelo
participativo e regionalizado do planejamento. Que se democratize e torne
transparentes as decisões dos gestores deste setor. E que seja extirpado de vez
a interferência de grupos políticos que tornaram o Ministério das Minas e
Energia um verdadeiro feudo.
* Publicado no Jornal Folha
de São Paulo (08/12/2012), em Tendências e Debates respondendo a questão:
Estratégia do governo para reduzir o custo da energia é correta?
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