Foto: Vladimir Platonov,Abr/Agência Brasil |
Está oficialmente aberta a temporada de
chuvas no Rio de Janeiro, e com ela infelizmente também se abre a
temporada de deslizamentos, enchentes e mortes. O verão mal começou e já
trouxe a primeira enxurrada, deixando um rastro de destruição nos municípios de
Duque de Caxias, Angra dos Reis e alguns outros na Região Serrana do Rio. Até
agora, os números oficiais da Defesa Civil são de um morto, oito desaparecidos,
1.262 desalojados e mais de 2 mil evacuados. Contudo, certamente
esses números estão subestimados e infelizmente vão aumentar ao longo dos
dias. No verão de 2011 o problema foi ainda mais grave, onde
mais de 900 pessoas morreram em uma tragédia que arruinou a cidade de Nova
Friburgo. Em 2010 a bola da vez foi o Morro do Bumba, em Niterói, deixando
mais de 260 mortos por soterramento. Ainda existem dezenas de exemplos
como esse, e eu torço muito para que esses episódios não se repitam,
mas sinceramente, analisando o histórico ambiental e os esforços políticos
atuais a possibilidade de repetição é alta.
Para entender o porquê dessas tragédias no
Rio temos que identificar a raiz do problema,
então vamos lá: (1) A geografia do Rio de
Janeiro é formada por terrenos naturalmente acidentados (inclinados),
encostas íngremes e clima tipicamente tropical, com grande
pluviosidade; (2) retirada da cobertura florestal das áreas
inclinadas, facilitando a infiltração de água no solo acima da capacidade de
absorção; (3) urbanização desordenada que leva a uma ocupação de
risco em encostas, sendo isso resultante do crescimento demográfico
excessivo; e (4) ausência de um sistema de escoamento de esgoto e
coleta de lixo eficaz. Como podemos ver, das quatro razões para o
acontecimento de tragédias, três são causadas pela irresponsabilidade
humana. Não podemos culpar a geografia fluminense. Mas então de
quem é a culpa, da população que ocupa encostas ou do governo que não
vê? Dos dois, mas não de forma igualitária.
Conversando com a amiga Carolina Dumard,
moradora de Petrópolis, na Região Serrana do Rio, ela me
informou que esse ano as chuvas já causaram deslizamentos,
soterramentos de casas, mas nenhum ferido (por sorte). Ao perguntar
sobre o que a prefeitura estava fazendo, a resposta dela foi: “Aqui
em Petrópolis tem um sistema de sirenes para avisar a população que vive em
áreas de risco para sair de suas casas. Não é a solução, mas poupa
vidas”. E ela continuou “Foram feitas mais de 20 obras de contenção de
encostas. A defesa civil ta se mostrando presente e prestativa.
Existe um bom sistema de escoamento, mas que acaba sendo muito prejudicado pela
própria população que não descarta o lixo corretamente. Mas desde a última
tragédia nem uma casa popular foi entregue”. Foi tanta informação que
terei que esmiuçar.
Um sistema de sirenes é realmente importante, mas
não substitui a ação direta do poder público sobre a população que vive nessas
áreas. Parte do problema seria resolvido com a retirada dessas
pessoas, que deveriam ser realocadas para casas populares em
áreas seguras. Mas o problema só não se repetiria se houvessem três ações
primordiais. A primeira é o reflorestamento das encostas desmatadas; a segunda
seria a intensa fiscalização e coibição de novas ocupações em encostas; e por
fim, uma ação de educação ambiental real, que instruísse a população que vive
em áreas de risco a serem mais responsáveis com o descarte de seu
lixo. A parte difícil é a remoção das pessoas. Difícil, mas não
impossível. Já as outras três medidas são relativamente baratas e de
fácil aplicação, e em teoria já estão dentro do orçamento e da agenda ambiental
de muitos municípios fluminenses. Se isso não está sendo feito, não vejo
outro motivo que não seja pilantragem política.
É claro que nessa questão entram muitas variáveis
problemáticas, como o insustentável crescimento populacional, ou como dito pela
própria Carolina “Não há mais espaço que possa ser seguramente habitado em
Petrópolis”, mas ainda assim é plenamente possível que seja
encontrada uma solução a curto e médio prazo, desde que haja comprometimento
para isto. O cenário atual é gravíssimo, mas a solução é simples.
Já temos casos de tragédias causadas
pela ação humana suficientemente documentados ao longo dos
séculos (vide o colapso dos Rapanui da Ilha de Páscoa), mas
parece que estamos longe de aprender. O exemplo das tragédias do Rio de
Janeiro são apenas mais um forte exemplo das consequências do desmatamento
e crescimento demográfico descontrolado em nossa sociedade. Ao
invés aproveitarmos a oportunidade para aprender a lidar com a esses
problemas, e tentar repensar nossas ações no planeta, estamos apenas assistindo
incólumes a essas crises ambientais que trazem dor e sofrimento para
a nossa sociedade, sobretudo aos mais pobres. Assistimos a apatia do
governo que covardemente se abstém de qualquer
responsabilidade, como se o soterramento de famílias inteiras fosse algo
natural e irremediável (ou seria proposital?). Quantas civilizações ainda
precisam ruir e quanto sofrimento precisaremos
sentir para percebermos que precisamos fazer alguma coisa?
E para a turma antiecologia de plantão, percebam
que não estou falando de plantinhas ou bichinhos, estou falando dos teus filhos
e da qualidade de vida deles.
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