sábado, 30 de março de 2013

Na paixão de Cristo, operário é sacrificado


E tropeçou no céu como se fosse um bêbado/ E flutuou no ar como se fosse um pássaro/ E se acabou no chão feito um pacote flácido. (Chico Buarque de Holanda)

Ademir Ramos (*)

Tempo é dinheiro. Na pressa de entregar a obra “no prazo religiosamente prometido”, a empresa Andrade Gutierrez faz virada para concluir o Estádio da Copa - 2014, também chamado de Arena da Amazônia, situado na Zona Centro-Oeste de Manaus (AM). Esta intensa jornada de trabalho sacrificou na noite de quinta-feira (28), as vésperas da Paixão de Cristo, o operário Raimundo Nonato Lima da Costa, 49 anos, que teve morte instantânea causada por traumatismo craniano depois de cair de um dos pilares da Arena.

Nome de santo, com certeza de família religiosa, Nonato, como era mais conhecido entre os amigos, dedicava-se ao seu trabalho pensando em celebrar a Páscoa em família, que por maldade ou descaso foram silenciados nos noticiários de imprensa – sem vez e sem voz. Quem era ele? Como vivia? Gostava de futebol ou não? Onde morava? Não interessa. Para Andrade Gutierrez, o que interessa mesmo é o trabalho, é o ritmo de produção acelerado, é a máquina em ação, contanto que a obra não pare e cumpra-se o cronograma definido e sacramentado.

O fato ocorrido parece isolado, mas se computarmos o número de operários sacrificados na construção civil teremos um quadro dantesco. O Nonato é apenas um numa estatística de milhares.

O fenômeno em si é recorrente e histórico. Vejamos, por exemplo, o contexto emancipatório do povo de Deus no Egito, que vivia também sob o trabalho escravo inserido num intenso ritmo de produção tendo por objeto a construção das pirâmides.

A celebração da Páscoa judaico-cristã é este momento litúrgico de profunda reflexão centrada nas lutas sociais; na organização dos movimentos libertários; no combate a exploração do trabalho; nas garantias dos direitos da pessoa humana, a exigir condições dignas de trabalho numa perspectiva espiritual e socialmente justa.

Enquanto a empresa diz lamentar a morte de mais um operário em construção, seus peritos talvez façam de tudo para provar que o fato ocorreu por única responsabilidade daquele que em vida se chamou Raimundo Nonato Lima da Costa. Com efeito, a seguradora não se responsabilizará por indenizar os familiares e se duvidar, ainda irá imputar ao Nonato a pecha de negligente, qualificando o acidente de “falha humana”.

Para os cristãos e aos Bem-Aventurados, neste contexto Pascal, o sacrifício do Nonato é carregado de simbolismo. Acontece numa área esportiva tal como o Coliseu, onde o Papa Francisco, nesta data, celebra a Via Sacra da Redenção. Ocorre também, em regime de trabalho intenso, num canteiro de obra de um megaprojeto tal como o das Pirâmides. E para completar, o operário sacrificado traz em si o nome de um santo que encerra em seu nascimento, o milagre da salvação e quem sabe sirva de luz para o cumprimento da Justiça do Trabalho nas trevas dos canteiros de obra do Brasil.

(*) É professor, antropólogo e coordenador dos projetos Jaraqui e do NCPAM/UFAM.

John, um negro da terra


José Ribamar Bessa Freire
31/03/2013 - Diário do Amazonas

Ele nasceu, em 1956, nos Estados Unidos. Era americano. Portanto tinha, inapelavelmente, que se chamar William ou John. Ficou John. Mas por ser filho de português, seu destino era ser registrado como Manuel ou Joaquim. Acabou herdando o Manuel do pai. E foi com esse nome composto - John Manuel - que veio de mala, cuia e Machado para o Brasil, onde criou raízes, filhos, livros e deixou marcas.

Aqui deu aulas, palestras e conferências, organizou eventos, iniciou estudantes na pesquisa, formou mestres e doutores, fez discípulos, vasculhou arquivos, pesquisou, escreveu, publicou, amou e foi amado, apaixonou-se pela história indígena e abrasileirou-se tanto que se transfigurou em negro da terra, termo consagrado em um de seus livros sobre índios e bandeirantes.

Foi ironicamente na Rodovia Bandeirantes, em Campinas, na terça-feira, que um táxi desgovernado chocou o carro dirigido por John, eliminando um dos expoentes da história indígena. Ele morreu no local, aos 56 anos, no auge de sua vida intelectual, vítima da guerra absurda do trânsito, que no Brasil mata anualmente mais do que qualquer guerra civil. Na última quinta-feira, 28 de março, depois de velado no salão da biblioteca, na Unicamp, foi levado para o Crematório na Vila Alpina, em São Paulo.

Índios e bandeirantes

O historiador John Manuel Monteiro era paulista, mas paulista de Saint Paul, Minnesota, onde nasceu. Lá, muitos moradores descendem de alemães e escandinavos, que migraram para os Estados Unidos no final do século XIX, encurralando a população nativa em reservas indígenas, que hoje sediam cassinos. Quando os portugueses e hispânicos chegaram, os índios já eram minoria discreta, mas capazes ainda de despertar o interesse de um pesquisador sensível e generoso como John, um paulistano de coração.

Desde a graduação em história, no Colorado College (1974-78), ele vinha buscando entender o processo de colonização portuguesa nos trópicos, inicialmente em Goa, na Índia, e depois no Brasil. No mestrado (1979-1980), focou seu interesse sobre o Brasil Império, no século XIX, e finalmente no Doutorado (1980-1985) na mesma Universidade de Chicago, debruçou-se sobre a escravidão indígena, os bandeirantes e os guarani de São Paulo.

Quando o conheci, em 1992, apresentado por Manuela Carneiro da Cunha, ele trabalhava com ela num grande projeto interdisciplinar, de âmbito nacional, que procurava localizar, mapear e avaliar a documentação manuscrita sobre índios existente nos arquivos de todo o Brasil. Fui convocado para coordenar a equipe do Rio de Janeiro. Com John, entramos em cada um dos 25 grandes arquivos sediados no Rio. No final, ele organizou a publicação do Guia de Fontes para a História Indígena e do Indigenismo em Arquivos Brasileiros.

O objetivo do projeto era criar uma ferramenta para combater a cumplicidade da historiografia brasileira que "erradicou os índios da narrativa histórica" ou tentou "torná-los invisíveis". OGuia foi elaborado por equipes que reuniu mais de cem pesquisadores em todas as capitais do país, coordenados por John Monteiro. Localizou muitos documentos desconhecidos e até então inexplorados, criando as condições para "repensar, de forma crítica, tanto o passado quanto o futuro dos povos indígenas neste país".

John Monteiro trazia considerável experiência em pesquisadocumental nos arquivos das Américas, da Europa e da Índia. Publicou, em 1994, o livro seminal Negros da Terra: Índios e Bandeirantes nas Origens de São Paulo. Lá, apoiado em farta documentação, redimensiona o papel dos índios na história de São Paulo e desconstrói a baboseira de que o bandeirante paulista contribuiu para alargar e povoar o território brasileiro. Recoloca na história do Brasil, como sujeito, o negro da terra ou gentio da terra, expressão usada para designar o índio escravizado.

Dança dos números

As pesquisas de John Monteiro fizeram uma revisão profunda do discurso sobre a "extinção", mostrando como as populações indígenas foram afetadas pelo colonialismo. Ele discute não apenas o declínio demográfico, mas também "os processos de recuperação e rearranjo das populações e das unidades políticas indígenas" no Brasil colonial. O artigo que publicou em 1994 - a Dança dos Números: a população indígena do Brasil desde 1500 - trabalha com a noção de etnocídio, a qual acrescentou posteriormente a de etnogênese.

Logo após a promulgação, em 2008, da Lei 11.645, que torna obrigatória a temática indígena em sala de aula, John Monteiro publicou o artigo Sangue Nativo na Revista de História, abordando a escravização dos índios no Brasil. Contribuiu, dois anos depois, com a produção de documentários "Histórias do Brasil', exibidos pela TV Brasil. Desta forma, sua produção acadêmica alcançou os professores da rede pública e privada de ensino e penetrou nas escolas.

John Monteiro havia assumido recentemente a direção do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Unicamp. É conhecido, admirado e querido em todo o Brasil, em cujas universidades seus livros são discutidos, mas também no exterior. Orientou e dirigiu pesquisas na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais, em Paris, e foi professor em várias universidades americanas - Harvard, Michigan e North Carolina-Chapel Hill (1985-86), onde nasceu Thomas, seu filho com Maria Helena Machado, pesquisadora da USP e companheira de todas as horas.  

No Grupo de Trabalho Índios na História, que John Monteiro articulava, sua morte foi sentida e pranteada. Mensagens de todos os recantos circularam nas redes sociais, expressando sentimento de dor pela perda irreparável. A Associação Brasileira de Antropologia (ABA), a Associação Nacional de História (ANPUH), a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS), entre outras, manifestaram o pesar da comunidade acadêmica:

"À sua esposa Helena e aos filhos Álvaro e Thomas, e demais familiares, estendemos nosso conforto e afeto. John será sempre lembrado por nós" - finaliza a nota da ABA, expressando um sentimento generalizado.

Aqui, no Diário do Amazonas, registramos um adeus saudoso a John Monteiro, reproduzindo mensagem do antropólogo Carlos Alberto Dutra, pesquisador da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul:

- Os povos indígenas perderam o historiador John Monteiro. Cientista social que sempre soube respeitá-los e traduzir para o mundo, para além das fronteiras da modernidade, suas lutas e seus direitos, pelos meandros da academia, seus livros e ensino. Que Ñhanderu o acolha e console seus admiradores pela perda.

Logo que assumiu a direção do IFCH, John Monteiro enfrentou um ato de vandalismo com firmeza, mas sem autoritarismo. Desempenhou o seu papel de educador lúcido e refinado na forma como tratou o episódio. Abaixo o email que enviou, naquela ocasião, a alunos, funcionários e professores. 

From: John  M. Monteiro
To: Alunos, funcionários e docentes
Sent: Friday, December 07, 2012 9:39 AM
Subject: [Ifch-docentes-l] Vandalism is NOT art

Caros Membros da Comunidade do IFCH,

Queria saudá-los com notícias mais alentadoras mas não posso deixar de trazer para a atenção de toda a comunidade a minha consternação com mais um ato de vandalismo. Ontem o IFCH amanheceu manchado. Pela segunda vez desde a conclusão do novo prédio da Biblioteca e mais uma vez no contexto de uma festa realizada nas dependências do Instituto, a grande superfície branca e limpa do novo prédio foi atraente demais para as pessoas que trouxeram tinta e deixaram a sua marca (veja as capturas em anexo). É impossível saber quem fez ou quais foram as suas motivações, mas as inscrições dão margem para especulação. Não se sabe, por exemplo, se as frases foram escritas em inglês para o benefício dos nossos visitantes estrangeiros ou se os autores já aderiram, por antecipação, ao movimento de adotar esse idioma na sala de aula e na elaboração de teses, como nas outras grandes universidades do mundo.

Mas não é nada disso. É muito pior. A primeira frase, à esquerda, simplesmente copia a letra de uma música do Pink Floyd. Consegue, de uma só vez, cometer duas transgressões que gostaria de ver eliminadas do nosso meio: o plágio, que não pára de crescer, e o desrespeito ao patrimônio público que é de todos nós. A frase à direita requer mais cuidado, talvez. O autor nos lança um desafio, ao pleitear o estatuto de arte para a sua garatuja e ao assinar a obra. Queria que este artista, ao invés de agir no calor da festa ou na calada da noite, defendesse publicamente a sua obra e sua mensagem. Quem sabe a maioria de nós aprovaria esta forma de adornar o espaço público. Nesse caso, deixaria de me queixar.

Falando sério, gente, isso tem que parar. Esta é uma universidade pública e é a responsabilidade de todos nós – administradores, docentes, funcionários e alunos – zelar por sua integridade, sua conservação, seu aprimoramento. Ao ver a nova biblioteca, que deveria ser o orgulho de todos nós, maculada, confesso que não senti raiva, nem fiquei com vontade de punir o responsável. Senti vergonha e senti que todos nós somos responsáveis de uma maneira ou outra. Senti vergonha porque o nosso instituto reúne um grande contingente de pessoas cujas pesquisas e ensinamentos ajudam a entender o que é arte, o que é vandalismo, o que é liberdade de expressão, o que é espaço público, o que é cidadania, entre tantas outras coisas que sinalizam o quanto este tipo de atitude é agressivo, desrespeitoso, inaceitável. Espero que na próxima festa tanto os anfitriões quanto os convidados reconheçam que não estão numa terra de ninguém e sim estão em casa, a casa de todos nós.

Saudações a todos,

John Monteiro
Diretor, IFCH

Energia nuclear e maledicências


Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco

Existem maledicências evidentes quando se defende a expansão de usinas nucleares no país, justificando-as com o que está ocorrendo em diversas partes do mundo, com a necessidade da núcleoeletricidade para garantir o crescimento econômico, e de relacionar a construção dessas usinas no Nordeste com o desenvolvimento regional.

No debate verifica-se uma intransigência de origem daqueles que comandam o setor. E um jogo de interesses de grupos que se beneficiariam caso estes projetos se concretizem, em detrimento dos interesses nacionais. Nem tudo é dito claramente, explicitado a sociedade, quando o assunto é energia nuclear. Há pouca informação manipulada que circula na grande mídia, desnudando o caráter antidemocrático e “fechado” que domina o setor energético, controlado por interesses políticos, econômicos e militares.

Se propagandeia falsamente que a indústria nuclear está em plena efervescência e florescente no mundo. Com mais, e mais paises adotando esta tecnologia como solução para atender suas necessidades energéticas. Toma-se como exemplo, os Estados Unidos da América, país que menos respeita a natureza e o mais poluidor do mundo, juntamente com a China. O EUA declinou de assinar o protocolo de Kyoto, não se comprometendo a reduzir suas emissões de CO2 (o principal gás de efeito estufa – GEE), além de dificultar nos fóruns internacionais, propostas para combater o aquecimento global. Mais recentemente, optou pela produção de gás obtido a partir do betume, combustível fóssil e com grande capacidade de emissão de GEEs,. Com certeza, este país não é exemplo para ninguém no que concerne suas escolhas energéticas e a defesa do meio ambiente.

Por outro lado, tenta-se desqualificar a decisão da Alemanha de abdicar da instalação de novos reatores nucleares e de desativar os já existentes em seu território. Chega-se a especular que tal decisão poderá se revista no futuro próximo. Não são citados outros paises que também abandonaram a construção de novos reatores, como a Itália, cuja decisão foi referendada em um plebiscito, onde mais de 95% dos votos foram contrários à construção de novas usinas nucleares. Também a Bélgica, Áustria dentre tantos outros que abandonaram a tecnologia nuclear.

A França, símbolo mundial no uso da eletricidade nuclear, com seu governo socialista, prometeu aos seus eleitores na última campanha presidencial, diminuir ao longo dos próximos anos o uso da energia nuclear em seu território, substituindo-a por fontes renováveis de energia. Portanto, os indecisos sobre a questão nuclear devem procurar as informações em diferentes fontes sobre o que ocorre no mundo pós Fukushima.

No Japão, hoje ocorre uma verdadeira queda de braço entre o primeiro ministro, que insiste na reativação dos 50 reatores que permanecem desligados depois da tragédia de 11 de março, e a população. Recente pesquisa de opinião mostra que mais de 70% da população japonesa é contrária ao uso da energia nuclear, e está disposta a impedir que o plano do primeiro ministro de religar as centrais aconteça.

A falácia de que a energia nuclear é essencial para atender as necessidades energéticas é um argumento que vem sendo utilizado desde a ditadura militar. Na época, para justificar o acordo Brasil-Alemanha em 1975, se previa a instalação de 8 reatores nucleares e se afirmava peremptoriamente, ser imprescindível esta fonte para ofertar mais energia para o crescimento do “gigante adormecido”. Somente uma foi construída, Angra II, iniciando sua operação em setembro de 1981. Quanto as 7 usinas restantes, realmente elas não fizeram falta, e o Brasil não entrou em colapso, conforme se apregoava.

Hoje, a ladainha volta à tona, com uma propaganda enganosa relacionando os “apagões” e desabastecimento com a urgência de se expandir o parque nuclear. Uma mentira sem tamanho, suportada por um planejamento energético equivocado, onde predomina as decisões políticas de um grupo encastelado há anos no Ministério de Minas e Energia, que apóia esta ou aquela tecnologia energética, em função de seus interesses imediatos e não da maioria da população.

Por outro lado, afirmar que a instalação de uma usina nuclear no sertão brasileiro é “uma oportunidade única que poderá ser o ponto de partida de um grande processo de desenvolvimento regional”, trata de uma promessa vaga, destituída de fundamento. E só quem acredita, em papai Noel, mula sem cabeça, saci pererê, coelhinho da páscoa, e tantos outros personagens do imaginário popular, crê nesta afirmativa.

A instalação de uma usina nuclear, do modelo previsto, orçada em mais de 10 bilhões de reais, produz menos empregos que as industrias da tecnologia eólica, solar, conforme o relatório sobre empregabilidade das indústrias energéticas da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Portanto, é um desrespeito ao já sofrido sertanejo alimentar o sonho de que investimentos de bilhões de reais na construção de uma usina nuclear, contribuirá para a melhoria de sua vida.

O povo nordestino já foi enganado, ludibriado, inúmeras vezes com propostas deste naipe, superlativas, megalomaníacas, e não vai se deixar iludir mais uma vez.

sexta-feira, 29 de março de 2013

PSOL Amazonas debate Ecossocialismo nos dias 5 e 6 de abril em Manaus e Rio Preto da Eva


O Partido Socialismo e Liberdade – PSOL, vai realizar dois eventos para discutir o Ecossocialismo, o primeiro será no dia 05 de abril (sexta feira) com inicio marcado para as 09:00h, na Câmara Municipal de Manaus, onde acontecerá o 1ºEncontro Ecossocialista do PSOL Amazonas, já o segundo Encontro será no sábado (06/04) na Câmara Municipal de Rio Preto da Eva distante 85 Km de Manaus no horário de 09: as 13:00h, todos os eventos contará com a participação de Lideranças Nacional do Partido.

O Ecossocialismo foi lançada por Joel Kovel e Michael Löwy no painel sobre ecologia e socialismo realizado em Vincennes, cidade próxima de Paris, em setembro de 2001 através do Manifesto Ecossocialista. O Manifesto foi publicado inicialmente como editorial, com dezoito subscrições, na revista Capitalism, Nature, Socialism - A Journal of Socialist Ecology (http://gate.cruzio.com/~cns/backissues/cont49.html), Vol. 13(1), março de 2002. A publicação em português é acompanhada da subscrição de 47 assinaturas de ambientalistas brasileiros.

O Manifesto Ecossocialista Internacional afirmam que: “O ecossocialismo retém os objetivos emancipatórios do socialismo da “primeira época”, ao mesmo tempo em que rejeita tanto os objetivos reformistas da social-democracia quanto às estruturas produtivistas das variações burocráticas do socialismo. O ecossocialismo insiste em redefinir a trajetória e objetivo da produção socialista em um contexto ecológico. Ele o faz especificamente em relação aos “limites ao crescimento”, essencial para a sustentabilidade da sociedade. Isso sem, no entanto, impor escassez, sofrimento ou repressão à sociedade. O objetivo é a transformação das necessidades, uma profunda mudança de dimensão qualitativa, não quantitativa. Do ponto de vista da produção de mercadorias, isso se traduz em uma valorização dos valores de uso em detrimento dos valores de troca um projeto de relevância de longo prazo baseado na atividade econômica imediata.”.

Desde a publicação do Manifesto, o Ecossocialismo vem tomando corpo e arregimentando seguidores mundo adentro. Hoje ele chega à Amazônia através do PSOL, Partido que nos dias 1, 2, e 3 de abril de 2011, promoveu em Curiba(PR) o I Encontro de Ecossocialistas do PSOL, onde foi fundada a Setorial Ecossocialista Nacional e publicado a Carta de Curitiba.

No próximo dia 05/04, o Partido realizará o 1º Encontro Ecossocialista do PSOL/AM, na oportunidade será constituída a setorial Ecossocialista Estadual, no sábado (06/04), o debate continua no Município do Rio Preto da Eva. Será um momento histórico tanto para o PSOL, como para os Movimentos socioambientais que militam na Amazônia, principalmente por colocar no debate ambientalista, o Ecossocialismo como instrumento para construção de uma nova civilização. “Ecossocialismo da Amazônia para o mundo uma nova civilização!”.

Elson de Melo - Secretário de Assuntos Amazônico - PSOL/AM

Acesse aqui o evento e confirme a sua participação em Manaus!
Para confirmar a participação em Rio Preto, acesse aqui.

Experiência pós morte: eu também vivi a minha !




(DEUS ME MANTÉM VIVO II)
Jornalismo Carlos Costa

Depois que o programa Fantástico exibiu o caso do médico neurocirurgião americano Alexander Eben, (que em 10 de novembro de 2006 foi levado às pressas para o hospital e seus colegas disseram à família que ele teria poucas chances de se recuperar entrando em coma em seguida), criei coragem para revelar minha experiência pós-morte, também. O professor da Escola de Medicina de Havard, que estudou o cérebro durante 25 anos e tinha explicação neurológica para tudo e, sempre, justificando que a morte significava o fim da vida, se convenceu que a morte é, na verdade, apenas o começo e passou a acreditar em vida após a morte, porque teve visões de um paraíso e voltou convencido de que existe vida do outro lado, depois da vida, eu também estou convencido da mesma existência de vida após a morte.

Com a coragem que Deus me deu e Alexander Eben confirmou, narrarei a seguir, o que nunca publiquei antes, em nenhum local, em detalhes, explicando a razão de eu ter escrito e pedido a publicação de minha crônica DEUS ME MANTÉM VIVO, porque temia que ninguém acreditasse em minhas palavras.

Fui internado de emergência com diagnóstico de “líquido em minha cabeça”, em maio de 2006 e fui submetido às pressas a duas cirurgias seguidas -  uma para remover o líquido – que era um empiema cerebral -  e, a segunda, para fazer correções de líquido que continuava sentindo dentro de minha cabeça, como fosse a água de um mar batendo nas pedras, sempre que virava para qualquer lado. Troquei de médico. Uma nova equipe médica, comandada pelo neurocirurgião Dr. Dante Luis Garcia Rivera,   decidiu me internar para uma nova cirurgia de emergência, no dia 4/10/2006, desta vez acompanhado pelos neurocirurgiões  Drs. Michael e Carreira.  Eu já se estava infectado por duas bactérias hospitalares e, em vez de líquido branco, incolor e sem cheiro, como na primeira vez, o que saiu foi um líquido purulento, mal cheiroso,  gerando um diagnóstico equivocado de câncer em metástase. Minha esposa, ao receber o resultado do exame realizado em Botucatu-SP, tido como laboratório referência mundial em diagnóstico de casos de câncer comandado pelo Dr. Carlos Backer. A nova equipe médica que tentou sem sucesso remover as bactérias sem sucesso durante sete horas, porque elas haviam construído uma espécie de casulo ocupando parte de meu cérebro, e sangrava muito e desistiram. Entrei em coma profundo por sete dias, depois dessa cirurgia, perdi a memória, a voz e nada conseguia falar ou reconhecer qualquer pessoa. Só que durante todo esse tempo, com tubos ocupando os espaços apertados de minha garganta, lutando pela vida, ouvia vozes, barulhos, na verdade eu era apenas um ator do núcleo de novelas da Rede Globo, contratado para representar, com realidade, uma das vítimas do acidente do avião 727-800 SFP, que a Gol Transportes Aéreos, com destino a Manaus, colidiu com o avião Legassy 600 PR-GTD, ocorrido em 29 de setembro de 2006. Depois de sete dias, despertei e vi um aparelho de TV  ligado 24 horas na UTI, que ainda repercutia notícias sobre o acidente, mas sem qualquer outro tipo de referência que me orientasse e passei a ver e ler nas paredes brancas da UTI, para qualquer lado que olhasse as letras “SJS” que as interpretei como sendo o significado da palavra “Só Jesus Salva”.  Minha esposa Yara, nada conseguia ver ou ler. Eu estava ocupando uma das UTIs do Hospital Santa Júlia, em Manaus, um dos melhores. Depois de sair do coma, ainda permaneci por uns 30 dias como um zumbi sem memória, não reconhecendo ninguém que me visitasse, só olhando fixo para um teto branco e com dificuldades na fala, gaguejando muito. Perguntei à minha esposa: “que dia é hoje”? Depois, lhe questionei: “quantos dias fiquei em coma?”.  Não acreditando que haviam se passado sete dias, perguntei novamente “que dia é hoje” com muita dificuldade e dores na garganta porque permaneci com tubos e sendo alimentado por sondas e fiquei convencido do que me relataram.

Como “ator de novelas da Globo”, me via e me sentia sendo transportado de um lugar para o outro, depois, de avião até o local do acidente no Estado do Pará, já todo maquiado e pronto para representar o papel de um dos acidentados que teriam supostamente sobrevivido ao acidente. Mas como? Não houve qualquer sobrevivente!  Também ouvia barulho de macas de outros atores que teriam sido contratados como eu, se movendo de um local para o outro pelos apertados corredores de onde nos encontrávamos  no set de filmagens. Isso tudo teria sido um delírio, sonho, pesadelo ou apenas uma indireta associação ao meu desejo de ter sido ator de teatro na adolescência, interrompido em meu primeiro trabalho no ensaio do texto do dramaturgo Ariano Suassuna, - “ O Alto da Compadecida”?

 Na peça, eu interpretaria o personagem “João Grilo”, como integrante da “trupe” de teatro de Álvaro Braga, juntamente com os atores Washington Alves, Carlos Garcia, Carlos Aguiar, Ednelza Saado, Mário Jorge Corrêa, comandados pelo dramaturgo amazonense Álvaro Braga. Muitos outros atores que dividiriam o palco comigo, também se dividiam entre o trabalho para ganhar dinheiro e o sonho de serem atores amadores. Alguns conseguiram e prosseguiram na carreira; outros, como eu, ficaram no sonho, apenas. Talvez tenha sido até melhor porque me tornei um cronista, depois de tentar ser poeta, impedido que fui pela ditadura do  Governo Militar que deu o golpe no Brasil e implantou no país a partir de  1964, que censurava quase todas minhas poesias do livro de estréia (DES)Construção, em 1978, com 18 anos apenas. 

Em 2008, quando novamente me internei e fui submetido a décima primeira intervenção cirúrgica, desde 2006, me senti nervoso, agitado, preocupado e comecei a me despedir dos amigos, porque pensei que fosse morrer na sala de cirurgia que ocorreria no dia seguinte. Pedi ao meu cunhado, pastor evangélico R. Rafael de Queiroz Neto, que fosse ao hospital para rezar  em minha cabeça. Ele rezou e eu tive uma noite tranquila e até sonhei, mas não lembro mais sobre qual o motivo de meu sonho, sei que era tranquilo, bom, como se Deus estivesse segurando em minha mão. No dia seguinte, ainda nervoso e agitado, fui levado à sala cirúrgica por volta das 19 horas e, enquanto ouvia vozes do médico e do anestesista conversando, fui anestesiado. Horas depois, ouvi barulho de maca nos corredores e vozes de novo. Em seguida, passei a ver uma luz branca muito forte em meu rosto. A forte luz estava me seguindo e me cegando não sendo possível ver os rostos das pessoas vestidas de branco como se fossem médicos – ou anjos de luz, quem sabe? – Conversavam entre eles enquanto me aplicavam  choques no coração, com desfibrilador e a cada choque eu pulava na maca, mas a luz branca seguia meu olhar para qualquer lado que tentasse virar. Depois, durante minha recuperação na UTI perguntei aos médicos sobre minha visão e se eu tinha recebido choques. Todos negaram. Em uma visita diária de meu médico neurologista, Dr. Dante Luis Garcia Rivera, perguntei novamente e me respondeu que tinha sido a melhor cirurgia que ele já tinha feito em meu cérebro e atribuiu ao nervosismo que senti ao entrar na sala cirúrgica, minha visão. É eu estava muito nervoso mesmo! 

Durante a visita que recebi de meu cunhado, o pastor protestante ao hospital, os dois se encontraram.  Quando apresentei meu cunhado Rafael de Queiroz Neto ao Dr. Dante os dois  conversaram longamente. O Dr. Dante contou casos pessoais seus sobre o que havia lhe contado e outros casos neurológicos de pessoas que, como eu, também permaneciam em coma por dias e tiveram visões de luzes brancas e pessoas de branco os socorrendo-as, como eu também tive. Eu ouvia tudo e, depois da conversa do médico e meu cunhado, usei meu “vermelinho” da marca Toshiba e, dentro do hospital, escrevi a crônica “DEUS ME MANTÉM VIVO”, publicada primeiramente no Blog da Floresta, criado e dirigido pelo companheiro jornalista já falecido recentemente, Orlando Farias,  e depois republicada e lida em muitos outros blogs pelo Brasil.

É...Dr. Alexander, eu também passei a acreditar em vida plena após a morte,  porque tive a mesma prazerosa e agradável sensação de que DEUS ME MANTÉM VIVO!

segunda-feira, 11 de março de 2013

Mil meu com mil teu


José Ribamar Bessa Freire
10/03/2013 - Diário do Amazonas

- Pinto porque a vida dói - disse um dia Iberê Camargo. Lembrei do artista plástico gaúcho agora, no momento em que completo mil textos publicados na mídia impressa. Este aqui é o milésimo. Por que escrever tanto? Talvez porque a vida dói e uma forma de tornar a dor suportável é manifestar tal sentimento, seja com pincel e tinta, seja com letra e palavras. Ou através da voz, do som, da música, do corpo.

Diante de pergunta similar feita em entrevista no canal de televisão France Culture, em 1990, o sociólogo Pierre Bourdieu respondeu:

- Escrevo, em primeiro lugar, porque isso me dá, psicologicamente, muito prazer. Além disso, porque fui um jovem rebelde e espero continuar sendo um velho rebelde. Essa foi a forma que encontrei de ser fiel à imagem que tenho de mim mesmo. Pode parecer narcisismo, mas é assim. O mundo social seria insuportável para mim, se eu não fosse capaz de me indignar.

Ele morreu rebelde, depois de sugerir que a gasolina que move a escrita, pelo menos a sua escrita, é o descontentamento, a necessidade de combater as injustiças do mundo. Quem escreve com essa perspectiva, cavalga as palavras da mesma forma que Dom Quixote encilhava o Rocinante, embora Carlos Drummond nos ensine que as palavras "são muitas, eu pouco" e que, por isso, sendo elas indomáveis, "lutar com palavras é luta mais vã". O poeta, porém, relativiza o pessimismo, acrescentando: "entanto lutamos mal rompe a manhã".

Outro tipo de motivação foi apresentada por Júlio Cortazar, eu acho, mas estou com preguiça de verificar no Google. Li em alguma parte que o escritor argentino ou outro profissional da palavra teria dito alguma coisa assim: "Escrevo para descobrir o que penso", destacando que o ato de escrever o ajudava a organizar seu pensamento.

Existem outras motivações prosaicas, mas igualmente legítimas. Há quem escreva pensando com isso conquistar namoradas (os) ou ganhar uns trocados, outros ainda escrevem como quem dá aulas, com o furor pedagógico de compartilhar o que sabe, todos com a esperança de encontrar leitores com quem compartilhar as dores, as dúvidas ou as certezas.

Digno de nota

O primeiro texto que publiquei num jornal nasceu de uma dor, de uma raiva. Ficou fora da lista dos mil, porque não consegui localizá-lo. Foi em 1964 ou 1965, quando eu estudava o curso pedagógico, no Instituto de Educação do Amazonas. No IEA velho de guerra, fui aluno de excelentes professores como Orígenes Martins, Carlos Eduardo Gonçalves, Mercedes Ponce de León, Isis Falcone, José Braga, Garcitylzo do Lago, Dilma Montezuma e mais alguns poucos que nos transmitiram o prazer de dar aulas.

A diretora do IEA, em plena ditadura militar, era dona Neusa Ferreira, arbitrária, autoritária, vingativa, perseguidora. Acontece que o curso era noturno e houve um apagão geral na cidade. Dona Neusa, moralista, temia que as alunas fossem bulinadas. Por isso, ordenou a retirada dos alunos e fechou-se lá dentro com as alunas. Lá fora, uma multidão de marmanjos ficou à espera de namoradas, irmãs, vizinhas.A diretora gritava, ordenando que fôssemos embora. Aproveitamos a escuridão para vaiá-la e xingá-la. Ela chamou a polícia. O pau comeu na casa de Neusa.

Depois de muito sopapo e até de estudante preso, como a luz não voltava e a noite avançava, ela liberou o mulherio já quase de madrugada e eu, enfim, pude acompanhar minha irmã Dile de volta à casa, onde havia uma velha máquina de escrever. À luz de vela, escrevi um texto horroroso, que começava assim, com um chavão: "Fato digno de nota ocorreu na noite de hoje...". De qualquer forma, consegui relatar o fato com relativa fidelidade, ridicularizando dona Neusa, o que mitigou a dor e a raiva.

Assinei embaixo do que escrevi e levei para o Diário da Tarde, da Empresa Archer Pinto. Lá fui recebido pelo jornalista Ulisses Paes de Azevedo, um sujeito pai d'égua, que não me conhecia. No dia seguinte, ele publicou "o fato digno de nota" sem mudar uma vírgula. Apenas omitiu meu nome, dizendo que preservava o anonimato "para proteger o autor da sanha ditatorial da diretora". Todo mundo achou que o autor havia sido o Lauro Henrique Pinheiro, presidente do Gremio Estudantil Marciano Armond. Fiquei na minha, não reivindiquei a autoria.

Mil gols

Depois disso, já residindo no Rio, cursei jornalismo na UFRJ. No segundo ano, ainda estudante, fui contratado com salário inicial de repórter, pela ASAPRESS, uma agência de notícias arrendada pela Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o que me permitiu publicar matérias em jornais de vários estados do nordeste e do sul, sempre movido à indignação. Algumas estão na lista (www.taquiprati.com.br).

Depois vieram outros jornais no Rio de Janeiro, todos de oposição, onde assinei também algumas matérias: O SOL, PODER JOVEM, O PAIZ (assim com "z"), CORREIO DA MANHÃe mais tarde fui correspondente em Paris do Opinião e, já em Manaus, fundador e redator chefe do Porantim - um jornal valente vinculado às lutas indígenas.

A maioria dos textos foram publicados mesmo em Manaus: na Crítica, onde nasceu o Taquiprati, no Jornal do Norte,de propriedade do Paulo Girardi, um jornal bonito e bem feito. Mas metade das crônicas foi publicada aqui, nesteDiário do Amazonas, que é uma espécie de segunda casa, onde estou desde 2003 e onde sempre gozei de total liberdade para compartilhar com os leitores a indignação.

Um texto jornalístico, como regra geral, não tem a qualidade de um texto literário. Escrever para jornal é isso: um dia você é lido, no outro está embrulhando peixe. De qualquer forma, se Pelé, com tanta notoriedade,  dedicou às criancinhas seu milésimo gol, por que um obscuro amazonense não pode dedicar sua milésima crônica aos raros leitores que embrulham seu peixe com o taquiprati? Afinal, quem lê, também lê porque a vida dói.

A teoria da recepção, surgida na Alemanha nos anos 1960, depois de pesquisar como é que um texto, seja ele literário ou jornalístico, é recebido por quem o lê, proclamou a soberania do leitor na recepção crítica de qualquer obra. Dessa forma, rompe com aquela noção do texto como algo fixo, imutável, engessado, unívoco, considerando a leitura como um processo de reconstrução do texto por parte do leitor. Quem escreve, constrói significados; quem lê, também constrói os seus. Neste caso, os mil textos apresentados no taquiprati podem ser considerados mil meu com mil teu, leitor (a). Confere?

De qualquer forma, já não iremos muito longe, não porque a vida tenha deixado de doer, mas porque chega uma hora em que o cansaço nos obriga a pendurar as chuteiras. Nas palavras de Drummond, "cerradas as portas, a luta prossegue nas ruas do sono".

Barata na pizza


E assim caminha a humanidade, reduzindo os homens em baratas e ratos enquanto seus mandatários vivem na gastança, alimentando outros insetos nos aposentos palacianos.

Ademir Ramos (*)

O encontro é sempre uma grande descoberta para satisfazer vontade, querência e, sobretudo, o prazer de estar juntos, compartilhando da mesa e das ideias por meio de um diálogo fraterno e salutar. E por falar nisso, levei um baita susto esta semana, quando reunidos, aptos para o banquete, abrimos a caixa da pizza e deparamos com uma barata no pedaço. Total desconforto e constrangimento para a barata que esperava estar só em seu banquete. De pronto, foi perseguida pelos famintos chegando a óbito por ter violado o espaço dos humanoides e também por ter decepcionada aos convivas.

O que dizer da cena e como descrever na sua inteireza para melhor compreender a estranheza da barata, que por algum momento deve ter se achado a realeza da pizza, sendo perturbada pelas pessoas que pensavam serem também as únicas a usufruir daquele momento fraterno marcado por reciprocidade e ternura.

As especulações foram muitas sobre a origem da barata. O fato é que desde quando o mundo é mundo e os homens se transformaram em “bípedes implumes”, a barata está em fricção com os agregados humanos. Em algum momento se dá por vitoriosa e em outros é fatalmente perseguida reduzida a pó de mico ou como parte da cadeia alimentar de algumas culturas.

Esta por sua vez faz pensar na condição do homem como vetor. Visto que o automóvel não é só instrumento dos humanos é também locação das baratas e, não venha dizer que o ocorrido resulta da condição higiênica do carro. O fato é que a barata faz parte do habitat humano há séculos. No entanto, o processo civilizatório não contempla a cascuda em seu universo e assim a guerra foi declarada, requerendo da indústria química poderosos produtos visando o mal das baratas para o bem do mercado.

Na trama social, os excluídos, explorados e dominados sentem-se tão perseguidos quanto às baratas, pena que não podem fugir pelos esgotos porque já vivem em condições desumanas concorrendo com as baratas, ratos e outros indesejáveis do sistema. E assim caminha a humanidade, reduzindo os homens em baratas e ratos enquanto seus mandatários vivem na gastança, alimentando outros insetos nos aposentos palacianos, transformando a política em pizza e a resistência da barata povo contra os inseticidas da corrupção e da impunidade, vivendo de teimoso por acreditar que ainda é capaz de se emancipar da bolsa família e outras migalhas compensatórias instituídas para amenizar o ataque dos miseráveis contra o megainteresse do poderio econômico em conluio com os políticos de estado. Pior do que as baratas e os ratos são os governantes e políticos tipo net que se afirmam na ignorância, ganhando o povo pela boca e a classe média pelos favores.        

(*) É professor, antropólogo e coordenador do NCPAM/UFAM.  

2 anos da tragédia de Fukushima


Há dois anos, em 11 de março de 2011, o mundo soube da tragédia de Fukushima: um fortíssimo terremoto e um tsunami de grandes proporções, a que se seguiu a explosão de uma usina nuclear com todas as consequências de um acidente nuclear: a difusão de radioatividade, que permanecerá ativa durante anos, ameaçando muitas gerações.

As noticias que chegam do Japão são cada vez mais preocupantes. Segundo o jornal Asahi Shinbum, há poucos dias perto da usina, foi encontrado um peixe com 5 mil vezes mais radioatividade que o permitido por lei, o que pode indicar que a usina destruída continua contaminando o meio ambiente e trazendo riscos para a saúde humana. Sabe-se também que um desastre ainda pior pode ocorrer se outro tremor destruir a piscina de refrigeração, onde 264 toneladas de varetas de combustível usado, contendo grande quantidade de césio-137, aguardam destino final. A dimensão do problema pode ser avaliada se considerarmos que 19 gramas desse mesmo césio 137 provocaram um grande número de vitimas em Goiânia, no Brasil, em 1987.

Nesta data, nos solidarizarmos com o povo japonês, pelo sofrimento que lhe é imposto e continuidade do uso irresponsável de uma tecnologia extremamente perigosa para produzir energia elétrica.

Mas também  hoje denunciamos à insegurança que caracteriza a cadeia de produção da energia nuclear no Brasil. A mineração em Caetité tem contaminado e deixado cada vez mais escassas as águas no entorno da mina, ameaçando a integridade ambiental, a saúde e segurança alimentar da população. A mina de Itataia em Santa Quitéria no Ceará antes mesmo de ser explorada, já ameaça 40 comunidades camponesas que vivem no entorno da mesma e correm o risco de sofrerem impactos irreparáveis na saúde humana, na produção de alimentos, na diminuição e contaminação da água, enfim, no direito de ir vir. As usinas de Angra dos Reis registram um histórico de acidentes e interrupções de funcionamento por problemas técnicos e o lixo atômico é uma ameaça presente e futura.

Denunciamos também a pressão que está sendo feita pelas empresas que lucram com essa tecnologia para que, a Caixa Econômica Federal brasileira desvie recursos de suas finalidades sociais para financiar o negócio nuclear, assegurando a conclusão de Angra 3, terceira usina nuclear de Angra dos Reis, entre São Paulo e Rio de Janeiro.

O governo brasileiro esperava um empréstimo de 1 bilhão e meio de dólares de bancos europeus, que contavam com a garantia da Companhia de Seguros Euler, da Alemanha. Mas o governo brasileiro não apresentou ao Parlamento Alemão relatórios confiáveis garantindo a segurança tecnológica da construção e funcionamento de Angra 3. Agora pressiona a Caixa Econômica Federal para compensar o financiamento perdido.

Exigimos a desativação de Angra 1 e 2 e a interrupção de Angra 3, para evitar que falhas técnicas ou erros humanos provoquem no Brasil a desgraça de um desastre como o de Fukushima. É fundamental proteger as mais de 170.000 pessoas que vivem nas proximidades das usinas, assim como milhares de brasileiros, facilmente alcançáveis por nuvens radioativas como as que se espalharam por toda a Europa, em 1986, com a explosão da usina nuclear de Chernobyl, na União Soviética.

A Coalizão por um Brasil Livre de Usinas Nucleares e a Articulação Antinuclear Brasileira reafirmam: NÃO QUEREMOS USINAS NUCLEARES NO MUNDO,  NEM NO BRASIL. Contamos com o apoio dos brasileiros de bom senso nesta iniciativa.

11 de março de 2013
  
 Articulação Antinuclear Brasileira (www.brasilantinuclear.ning.com)

Coalizão por um Brasil Livre de Usinas Nucleares (www.brasilcontrausinanuclear.com.br)

segunda-feira, 4 de março de 2013

Vó Mariinha


José Ribamar Bessa Freire
03/03/2013 - Diário do Amazonas

Maria Cândido Barbosa (1918-2013), a vó Mariinha, líder religiosa - uma das mais antigas do Rio de Janeiro - disse adeus e partiu na sexta feira passada. Tinha 95 anos. Na sua juventude, como católica fervorosa, fez parte da Pia União das Filhas de Maria. Mas na década de 50, trocou a fita azul e o uniforme da Congregação por outra bandeira e ingressou na Umbanda, religião a qual dedicou sua vida.

Filha de santo de Carlito Edileus Vieira, conhecido Babalorixá, ela logo se formou Ialorixá, tornando-se uma respeitada Mãe de Santo. Fundou a Associação Espírita Afro-Brasileira Taba de Pindaré e Terreiro de Sobe Serra, e exercitou sua religiosidade neste lugar situado num lugar privilegiado da mata atlântica, em Angra dos Reis (RJ). Deixou mais de 500 filhos de santo.

Filha de uma descendente de índios com um português, Mariinha nasceu lá, no Sertão do Carijó, no Bracuí, em Angra, no dia 30 de janeiro de 1918. Ainda criança mudou-se para a sede do município, onde trabalhou duro para conseguir seu sustento e de sua família. Muito antes da abertura da rodovia Rio-Santos, quando Angra dos Reis era o maior produtor de sardinhas do Brasil, ela foi contratada como operária por uma fábrica de enlatados. Com o declínio da atividade pesqueira e o fechamento de mais de duas dezenas de fábricas, passou a dedicar-se exclusivamente às atividades religiosas.

Vó Mariinha conheceu seu companheiro de 50 anos de vida, com quem teve 8 filhos sanguíneos (7 filhas e um filho) e 3 adotivos, que lhe deram 18 netos e 13 bisnetos. Sem contar as diversas crianças que amamentou ao longo da existência. Um dos filhos adotivos da vó, o Nel, era jornalista, comunista convicto, que declinou de um convite para trabalhar em Cuba, preferindo ficar com a sua família no Brasil. Todos eles foram educados dentro da religião, aprendendo com a mãe a respeitar os outros na diversidade.

Rui, o único filho de sangue, é ogã, toca atabaque e conhece os pontos de cada orixá e guia, cantados nas sessões. Ele testemunhou a entrega da Vó Marinha às causas sociais. Nos anos 60, quando sequer existia escola na região, movida pelo amor às crianças e pela solidariedade, Vó Mariinha montou uma escola primária, com recursos próprios, gratuita, no Encruzo da Enseada - na Japuíba. Suas próprias filhas é que davam aulas às crianças.

Seu ingresso na Umbanda - grande norte de sua vida - se deu quando tinha 30 anos, encaminhada pelo seu irmão Antônio Cândido de Almeida. A Associação Espírita Afro-Brasileira Taba de Pindaré e Terreiro de Sobe Serra, que ela fundou, teve sempre como bandeira a caridade e o amor entre os seus pares. O Centro da vó está cercado por uma mata exuberante e importante mina d'água, a mina da Oxum, fato que o torna singular em toda Angra dos Reis. Esse foi o lugar escolhido pelo Caboclo Sobe Serra para ser a sede do terreiro, há mais de 60 anos.

A vó Mariinha se tornou um ícone e um exemplo para a Umbanda em todas as suas vertentes. Ensinou seus filhos de santo, que aprenderam a amar e a caminhar a partir dos ensinamentos do Caboclo Sobe Serra - seu mentor, e da sabedoria da vovó Catarina - uma preta velha muito esclarecida que a acompanhou desde sua infância, bem como do seu Rei Congo, entre outros guias de luz.

Em toda a sua vida, a vó Mariinha não mediu esforços para cumprir os seus deveres de Mãe de Santo e exercer a sua "regilião", como falava ao se referir à  Umbanda. Por diversas vezes, saiu de sua casa, no centro de Angra, até a Japuíba, ficando horas com a vó Catarina, seu Rei Congo, seu Sobe Serra na terra. Ali acolhia a todos, ajudando enfermos e desesperados.

Antes de morrer, doou parte de seu patrimônio, especialmente um terreno, para a construção de uma escola (o Colégio Municipal Mauro Sérgio da Cunha), para a construção da igreja Santa Teresinha, ambas localizadas na Japuíba. O mesmo fez a dezenas de filhos de santo, que hoje possuem um lar graças à vó Mariinha.

Desde criança - ainda no Bracuí - a vó aprendeu a cantar jongo e folia de reis. Chegou a fazer parte do grupo de folia dos reis de Carmo Moraes, ex-combatente da Segunda Guerra e filho de santo da vó, que morava no Morro do Carmo. Aos 95 anos a vó lembrava ainda de algumas dessas músicas e em diversos momentos, ela cantava em seu terreiro, em sua casa, os pontos, alguns em língua yorubá, com contribuição de línguas indígenas. Cantava, dançava, ensinava e repartia amor. O terreiro era o lugar da pedagogia da oralidade, do ver e ouvir, do aconselhar e acalmar.

Vó Mariinha gostava de contar histórias, lembrando momentos de sua vida. Uma dela ocorreu quando era muito criança e caiu numa fogueira - nessa época era comum as pessoas fazerem fogueiras dentro de casa. Todos ficaram impressionados, porque ela levantou-se sozinha da fogueira. Anos depois, quando começou a trabalhar com a vó Catarina, a preta-velha, disse que foi ela quem a tirou do fogo. Para não esquecer o acontecido, carregou, em uma das mãos durante toda sua vida, a marca da queimadura.

No último ano de sua vida, Vó Mariinha diminuiu o ritmo, mas não deixou de ir ao menos um dia na Japuíba, para encontrar seus santos e Neusa - filha de coração e seu braço direito. Com ela, estabeleceu uma relação de amizade, de carinho que atravessou longos anos. As duas estavam unidas pela Umbanda. Nas palavras de um dos netos, Alexandre Klippel: "Uma palavra que define a minha vó é fé. A minha vó tem uma fé, que é inabalável".

Daqui do Diário do Amazonas, em Manaus, saudações a Vó Mariinha: que seu sono seja calmo, nesta longa noite que se finda.
  

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