E assim caminha a humanidade, reduzindo os homens em baratas e
ratos enquanto seus mandatários vivem na gastança, alimentando outros insetos
nos aposentos palacianos.
Ademir Ramos (*)
O encontro é sempre uma grande descoberta para satisfazer vontade,
querência e, sobretudo, o prazer de estar juntos, compartilhando da mesa e das
ideias por meio de um diálogo fraterno e salutar. E por falar nisso, levei um
baita susto esta semana, quando reunidos, aptos para o banquete, abrimos a
caixa da pizza e deparamos com uma barata no pedaço. Total desconforto e
constrangimento para a barata que esperava estar só em seu banquete. De pronto,
foi perseguida pelos famintos chegando a óbito por ter violado o espaço dos
humanoides e também por ter decepcionada aos convivas.
O que dizer da cena e como descrever na sua inteireza para melhor
compreender a estranheza da barata, que por algum momento deve ter se achado a
realeza da pizza, sendo perturbada pelas pessoas que pensavam serem também as
únicas a usufruir daquele momento fraterno marcado por reciprocidade e ternura.
As especulações foram muitas sobre a origem da barata. O fato é
que desde quando o mundo é mundo e os homens se transformaram em “bípedes
implumes”, a barata está em fricção com os agregados humanos. Em algum momento
se dá por vitoriosa e em outros é fatalmente perseguida reduzida a pó de mico
ou como parte da cadeia alimentar de algumas culturas.
Esta por sua vez faz pensar na condição do homem como vetor. Visto
que o automóvel não é só instrumento dos humanos é também locação das baratas
e, não venha dizer que o ocorrido resulta da condição higiênica do carro. O
fato é que a barata faz parte do habitat humano há séculos. No entanto, o
processo civilizatório não contempla a cascuda em seu universo e assim a guerra
foi declarada, requerendo da indústria química poderosos produtos visando o mal
das baratas para o bem do mercado.
Na trama social, os excluídos, explorados e dominados sentem-se
tão perseguidos quanto às baratas, pena que não podem fugir pelos esgotos
porque já vivem em condições desumanas concorrendo com as baratas, ratos e
outros indesejáveis do sistema. E assim caminha a humanidade, reduzindo os
homens em baratas e ratos enquanto seus mandatários vivem na gastança,
alimentando outros insetos nos aposentos palacianos, transformando a política
em pizza e a resistência da barata povo contra os inseticidas da corrupção e da
impunidade, vivendo de teimoso por acreditar que ainda é capaz de se emancipar
da bolsa família e outras migalhas compensatórias instituídas para amenizar o
ataque dos miseráveis contra o megainteresse do poderio econômico em conluio
com os políticos de estado. Pior do que as baratas e os ratos são os
governantes e políticos tipo net que se afirmam na ignorância, ganhando o povo
pela boca e a classe média pelos favores.
(*) É professor, antropólogo e coordenador do NCPAM/UFAM.
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