quarta-feira, 29 de agosto de 2018

ECOSSOCIALISMO: Autogestão coletiva no campo


ELSON DE MELO*
QUARTA, 29 DE AGOSTO DE 2018

Na Amazônia não existe nenhum diagnostico que aponte a prosperidade individual da maioria da sua população que moram nos rincões da Região.

A principal atividade que pode gerar prosperidade para essa população é a produção de alimentos, para que isso aconteça de forma ordenada, precisa de gestão coletiva, seja através de Cooperativas de Produção Rural, ou outros tipos de associações ou organizações coletivas que organize a produção e a comercialização dos produtos.

No interior da Amazônia as famílias se auxiliam mutuamente através do ‘puxirum’ uma pratica comum de trabalho coletivo, esse é o primeiro caminho para a organização de um projeto sustentável envolvendo grupos de famílias, é através do trabalho coletivo que podemos organizar a produção e a comercialização dos produtos sem a figura do atravessador.

Um grupo autogerido, é capaz de dividir tarefas de produção, logística e comercialização. Em uma cooperativa podemos chamar isso de organizar departamentos que cuidem da produção; buscando inovar em tecnologias que facilite uma boa colheita, diversificar produtos, agregar valor e organizar o trabalho coletivo, departamento de logística; para dar suporte tanto na produção como na comercialização, departamento comercial; para organizar as compras, formular preços, identificar mercados, fechar negócios e promover vendas.

Como temos afirmados em outros textos, “não existe na Amazônia, outra forma de trabalho que consiga promover a prosperidade que não seja a coletiva”.

Autogestão é a administração de um organismo pelos seus participantes, em regime de democracia direta. Em autogestão, não há a figura do patrão, mas todos os membros envolvidos no negócio participam das decisões administrativas em igualdade de condições.
  
“Autogestão é uma forma de organização e orientação do trabalho coletivo que surgiu historicamente decorrente da necessidade da classe trabalhadora superar as crises de desemprego oriunda das crises cíclicas do capitalismo, os princípios ideológicos são o socialismo libertário, cuja a definição de algumas características fundamentais da autogestão ajuda a entender melhor essa forma de produção em grupo:

1.     A livre associação;
2.     As lideranças emergentes, hierarquia situacional, democracia;
3.     Decisão preferencialmente por consenso;
4.     possibilidade de secessão.

Livre Associação

Livre associação acontece (falando em primeira pessoa) quando estou participando de um grupo no qual meu interesse sobre os resultados, consequências e influência do trabalho coletivo realizado coincide com meus objetivos pessoais, ou seja, é direto, é meu, é primário.

Um grupo ao qual estou unido porque quero e do qual posso sair quando bem entender.

O termo interesse direto serve para distingui-lo do interesse indireto ou secundário que se estabelece na relação de trabalho denominada emprego. “Emprego” é sinônimo de uso, utilização de um meio para algum fim: emprego de uma ferramenta, emprego de uma metáfora, emprego de uma tecnologia, emprego da força de trabalho de pessoas em empreendimentos cujo interesse pelos resultados, consequências e influência do trabalho coletivo realizado é de quem emprega. Esse interesse pode ou não ser também de quem é empregado, mas o interesse comum primário entre empregado e empregador se estabelece pela via monetária.

Em autogestão o interesse por ganhar dinheiro pode existir. Acontece que, quando existe, é secundário ao interesse pelo resultado ou influência do trabalho em si.

Para quem quer ganhar dinheiro em primeiro lugar, serve juntar-se a qualquer empresa que pague bem e melhor é o emprego que paga mais.

Para quem quer realizar uma obra coletiva por interesse pessoal em primeiro lugar, só serve aquela produção específica e é através dela que se vai ganhar dinheiro.

Consenso

Consenso significa discutir os pontos que necessitam de decisão coletiva até que todos concordem com a mesma ideia. Seja essa ideia uma mudança na forma de produção, a data de uma reunião, o custo de um produto, uma propaganda, a escolha de um representante do grupo ou qualquer outra decisão ou escolha coletiva.

Todos concordarem com a mesma ideia não significa que não há necessidade de algumas pessoas cederem para chegar a um acordo. Nesse contexto, no entanto, ceder significa abrir mão de opiniões iniciais sobre a questão, por transformação durante a discussão sobre as diversas diferentes ideias do grupo.

Consenso é diferente da chamada “votação democrática”.
O consenso leva a discussão das diferentes partes até o fim enquanto que a votação é um congelamento da discussão no tempo, o retrato do momento em que se vota.

Na votação, as pessoas defendem os diferentes pontos de vista sobre a questão, buscando convencer umas às outras durante algum tempo. Em determinado ponto cessam as discussões, encerram-se os debates, vota-se e descobre-se a vontade da maioria numérica e a minoria é obrigada a aceitá-la. Por isso a votação também pode ser entendida como uma ditadura da maioria.

No consenso as pessoas debatem a questão até que todas concordem com a mesma decisão. Quem cede, cede porque se transforma, porque entende a necessidade de haver um acordo para que o grupo realize coletivamente um trabalho que interessa também a pessoa que cede. A busca do consenso faz com que a minoria tenha tanta força quanto a maioria. Uma pessoa que não concorde com todo o grupo tem a oportunidade de virar um consenso a seu favor e essa decisão pode realmente ser a melhor para todo grupo.

O consenso pode exigir mais tempo e energia dedicados ao debate entre as diferentes partes do que a votação, mas o consenso gera uma ordem de nível superior que se estabelece sem imposição e com corresponsabilidade. Não uma ordem perpétua e definitiva, mas uma ordem mutante, situacional, racional e passional, que mantém sempre aberta a possibilidade de revisão do pré-estabelecido.

Falso consenso

Quando esse ato de ceder para que haja um consenso não é autêntico, não acontece por transformação, mas por autoimposição, quando há dificuldade ou preguiça de se exporem as divergências, ocorre o que chamamos em autogestão de “falso consenso”. Há um acordo onde externamente todos parecem concordar, mas a discussão deveria ter prosseguido porque internamente algumas pessoas ainda não concordam.

Em ambiente autogerido, todo falso consenso se revela com o tempo.

Um exemplo simples: uma pessoa pode ceder, em nome de um consenso, sobre o horário marcado coletivamente para uma próxima reunião de trabalho concordando em chegar mais cedo e, depois, nessa ocasião futura, chegar atrasado. Houve um falso consenso que se revelou e o resultado foi que a reunião começou efetivamente mais tarde. No momento da discussão talvez o consenso estivesse em todo grupo ceder àquela pessoa e chegar mais tarde, aproveitando o tempo para outras coisas. Esse acordo poderia ter surgido se a pessoa em questão tivesse deixado clara o quanto não estava disposto a chegar cedo. Ou ainda a revelação da inconformidade com chegar mais cedo poderia ter prolongado a discussão até que essa pessoa estivesse realmente convencida de que era preciso chegar mais cedo.

Todo falso consenso prejudica e boicota o trabalho coletivo.

Liderança emergente – hierarquia situacional

Isso significa dizer que não existe a figura do gerente, chefe, patrão, dono, professor, diretor, grande líder, etc.

Todos podem e precisam exercer esses papéis de liderança conforme a necessidade do grupo nas diferentes situações que vão surgindo no decorrer do trabalho coletivo.

A liderança surge da situação, é situacional, emergente, temporária. Quem tem maior experiência prática e/ou teórica sobre os assuntos que envolvem o trabalho coletivo fala, ensina, orienta, lidera.

Quem tem menos experiência e conhecimento, mas tem interesse em que o trabalho se realize da melhor forma possível, obedece, segue, escuta. Isso significa que existe hierarquia na autogestão.

A hierarquização é natural no processo de trabalho coletivo. Não fere os princípios da Autogestão quando pessoas do grupo seguem comandos dados por quem tem mais autoridade construindo uma estrutura hierárquica situacional.

O problema está em cristalizar essa situação, congelar os papéis daquele que comanda e daqueles que obedecem. A melhor solução para um momento não é a melhor solução para todos os momentos. Autogestão significa um grupo permanecer aberto para alterar sua estrutura hierárquica a qualquer momento.

Quem comanda deve estar aberto para dividir ou abrir mão desse papel assim que surge uma nova liderança no grupo. Quem obedece deve estar aberto ao salto para liderança. Para isso é importante perceber que aquele que obedece não tem menor responsabilidade pelo trabalho do que aquele que comanda.

Em Autogestão, se o resultado do trabalho é bom ou ruim a responsabilidade é de todos. Os méritos ou deméritos são para todos. Esse entendimento nos impulsiona a assumir responsabilidade de liderar uma situação quando percebemos que, por nossa experiência ou conhecimento no assunto, o grupo necessita de nossa orientação, de nossa opinião, da ideia que surgiu em nossa mente que pode melhorar a rotina de trabalho, etc.

Possibilidade de Secessão

Secessão significa a possibilidade de qualquer um propor a saída de qualquer outro do grupo. Reunir o grupo e colocar esse assunto como pauta de discussão. Expor os motivos pelos quais entende que deve haver uma secessão.

Visto que as decisões em autogestão são consensuais, para ocorrer a secessão de alguém é preciso, primeiro, que a pessoa que a propôs exponha abertamente seus motivos e convença todo grupo que também será melhor para todos que aquela(s) pessoa(s) não faça(m) mais parte daquele grupo de trabalho e, segundo, que a(s) própria(s) pessoa(s) secessionada(s) concorde(m) com sua saída do grupo.

Perceba que assim como não há "emprego" em Autogestão, também não há "demissão".

A livre secessão é a outra face da moeda da livre associação. Ambas ajudam a fazer a constante renovação e afirmação dos interesses pessoais com o trabalho coletivo.”
(...)site: abcpsigma

Esses princípios básicos da organização coletiva, são essenciais para o sucesso da Autogestão, portanto, todo grupo autogerido, deve se preocupar sempre com a educação formal de seus membros, com a formação politica pra que todos seja capazes de entender cada processo dentro da gestão, como afirmamos acima, mesmo que cada pessoa exerça uma função especifica na Autogestão, todos são importante na engrenagem do negocio, caso um não cumpra corretamente a sua função, coloca em risco toda organização e o resultado final do negocio, ou seja, se o responsável, da logística não manter abastecido as frentes de trabalho, todo o processo fica parado e o prejuízo é eminente, portanto, é importante que cada pessoa agarre a sua tarefa com entusiasmo e dedicação.

Na Autogestão, se não houver organização, não existe produção coletiva e nem resultado final positivo.

*Elson de Melo, é sindicalista e militante do PSOL.


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