domingo, 11 de setembro de 2011

VERDADES INCONVENIENTES

NCPAM - Marcos Romano (*)


No último domingo (4 de setembro de 2011), saiu uma matéria no Diário do Amazonas, onde Marcelo Lima (Secretário da Seplan) e Laurits Hansen (Dir. da Lajes Logísticas), defendem seus interesses e desclassificam todos os que defendem os reais interesses da comunidade amazônica.

O Secretário da Seplan se utiliza de números sobre o faturamento das empresas do Pólo Industrial de Manaus (PIM), defendendo a importância da construção do Porto das Lages. E ainda afirma que as ONGs e intelectuais contra o empreendimento (no local que querem construir) são manipuladores da massa, que segundo ele é desinformada.

Na defesa do seu empreendimento o Diretor da Lajes Logística, nobremente diz que “o Terminal Portuário das Lajes vem a ser uma ferramenta de competitividade no Pólo Industrial de Manaus, então fica fácil saber quem nós não estamos agradando”. Então, a seguir argumentam, tacanhamente, a respeito do tema.

O título do artigo de Marcelo Lima (Secretário da Seplan) inserido na reportagem era assim definido: Verdade Inconveniente. Esse senhor reconhece que toda verdade é inconveniente, principalmente, quando não há lisura no processo real dos interesses. De um lado está o interesse de uma minoria que não pensa um palmo além do próprio nariz, do outro está a sociedade resistindo como pode a ataques de gafanhotos famintos por lucros exorbitantes.

Toda verdade é sempre inconveniente, ainda mais, quando os interesses são escusos e atendem somente à vontade de certos grupos que, esses sim, manipulam as informações, omitem e mentem, apenas para disfarçar seus reais intentos. Assim tem sido desde os primeiros momentos que anunciaram a construção do Porto das Lajes. Seus defensores usam de toda força e método para persuadir e tentar convencer a todos de que esse empreendimento de ganho unilateral é melhor para todos.

“Em 2010 o faturamento do Pólo Industrial de Manaus (PIM) foi de R$ 61 bilhões de reais e a projeção para 2011 é de R$ 68 bilhões”, afirmou Marcelo Lima em seu artigo.

De fato os dados e previsões saltam aos olhos, porém o que tudo isso representa em termos de geração de emprego, renda e bem-estar para a população. Sem querer atacar o modelo ZFM, reflitamos sobre os dados a seguir, já que os defensores do terminal portuário buscam justificar tudo em função do aumento da lucratividade do PIM. Digo que não sou contra tal empreendimento, desde que seja construído em outro lugar.

Entre as décadas de1970-80, o PIM tinha cerca de 500 empresas faturando 5 bilhões de reais anualmente e empregava, aproximadamente, 70 mil trabalhadores, sendo que Manaus tinha 311.622 habitantes (IBGE, 2004). Hoje a realidade é outra, de um lado, o PIM fatura doze vezes mais, empregando pouco mais de 100 mil trabalhadores. De outro, Manaus tem aproximadamente, 1,8 milhões de habitantes (IBGE, 2010), isto é, nove vezes mais que na década de 70. De toda essa montanha de dinheiro, apenas 2,6% ficam no Estado na forma de salários.

Essas são verdades muito inconvenientes! “O compromisso com o desenvolvimento terá sempre primazia sobre o argumento tacanho de pseudo intelectuais e certas ONGs que sub-repticiamente manipulam a massa desinformada e promovem um entrevero puramente ideológico distante dos reais interesses da coletividade”, Marcelo Lima.

Não sei que compromisso é esse que só favorece um e outro grupo ganancioso, é o que me dizem os valores acima destacados, e pouco se justifica quando atentamos para a realidade do povo amazônico, e nos salários dos trabalhadores do PIM, pois, como é sabido, o salário médio dos trabalhadores do nosso Estado está abaixo da média nacional. Verdade inconveniente! Se há alguém que está a favor do povo é taxado de pseudo intelectual, como se fosse fácil dar a cara à tapa e ser desqualificado por meros palavreados sem substância.

Assim fazem com entidades representativas e pessoas ligadas à causa em questão, chamando-os de manipuladores da massa. Se assim fosse, não teriam, esses senhores, a chance de se queixar. Ainda pior, é afirmar que a população é desinformada quando ela é contrária a privatização de um bem coletivo, que é o Encontro das Águas. Não bastasse essas coisas, diz que é pura ideologia nossa ir contra esse empreendimento que agride, sorrateiramente, um dos mais belos patrimônios naturais. Ao menos, temos uma bela ideologia e não é falácia nem promessa sem fundamentos. Verdades inconvenientes!

“O Terminal Portuário das Lajes vem a ser uma ferramenta de competitividade no Pólo Industrial de Manaus, então fica fácil saber quem nós não estamos agradando. De parte disso, surgiram mitos e inverdades que contribuíram para se construir uma imagem negativa do terminal”, argumenta Laurits Hansen (Dir. da lajes Logística).

Percebe-se como esses senhores estão alinhados nas suas idéias, parece até que conversaram antes de escrever ou escreveram juntos seus artigos. Aqui temos até mitos, pois assim é chamado qualquer argumento que não tenha posição de defendê-los, como se mito fosse mero desvario de idéias. Pelo menos o nosso mito é legítimo, e viver na Amazônia sem mito é não viver nela. Verdades inconvenientes!

Não sou contra o progresso, desde que não particularize uma propriedade que é de todos e de gerações futuras. Essas coisas não nos agradam de fato e sou contra qualquer um que imbeciliza minha opinião e de pessoas e entidades sérias. Verdades inconvenientes! E na Amazônia qualquer terminal no Encontro ou próximo do Encontro das Águas é sempre uma imagem negativa!

“Para a construção do porto, é necessário avaliar questões como a profundidade do rio, áreas para armazenagem, acesso fácil, além de estar alinhado com o plano diretor da cidade. É o único lugar que preenche esses requisitos”, defende Laurits Hansen.

A parte mais profunda do nosso rio fica em Itacoatiara (120 metros de profundidade). O armazenamento não precisa de um Encontro das Águas. Para ser acessível não há necessidade de estar incrustado como carrapato na orla de Manaus. Alinhado ao plano diretor? Se fosse construído em outro lugar já estaria alinhado. E de fato, esse lugar que querem construir o terminal, preenche todos os requisitos que nega o terminal. Verdades inconvenientes!

(*) É artista plástico e acadêmico de Ciências Sociais da UFAM.

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