Titular da comissão que avalia as mudanças do Código Florestal brasileiro, o deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) faz forte oposição ao parecer do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) que flexibiliza a lei florestal.
Amazonia.org.br - Que visão seria essa?
Amazonia.org.br - A estratégia então é realmente postergar ao máximo essa votação?
Valente criticou o relatório elaborado pelo deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que, segundo ele, é prejudicial por alterar toda a legislação ambiental. "O deputado Aldo Rebelo assimila a visão do Brasil exportador de commodities, de produtos primários sem valor agregado. Ele não tem a visão de que a floresta de pé hoje é muito, mas muito mais valiosa do que derrubada".
Segundo o deputado do PSOL, a estratégia no Congresso Nacional será abrir o debate à população, e tentar protelar a votação do projeto no Plenário para depois das eleições. "Eu acredito que a gente não vota o relatório, e que a discussão pode ficar para o ano que vem".
Confira a entrevista.
Amazonia.org.br - O senhor é um dos deputados que fazem oposição às propostas do deputado Aldo Rebelo para o Código Florestal. Qual a leitura que o senhor e o PSOL fazem desse parecer?
Ivan Valente - O substitutivo do deputado Aldo Rebelo é, na minha opinião, nocivo ao desenvolvimento sustentável brasileiro e às gerações futuras.
Em primeiro lugar, ele é deseducativo: promove uma anistia geral ao que já foi desmatado. Todos os desmatamentos que ocorreram até 2008 estão liberados, consolidados. Quem desrespeitou a lei vai ser anistiado e pode até receber crédito público, e quem preservou e obedeceu a lei foi punido.
Ao mesmo tempo, o parecer tem uma dedicação especial ao que chama de produtores, agricultores que, segundo o deputado, estão sendo criminalizados no nosso país. Diferente dele, nós vamos dedicar o voto separado à defesa do meio ambiente, a todos trabalhadores e trabalhadoras e à soberania nacional, e não só a uma fatia desses trabalhadores.
Uma segunda questão é que, ao mudar o código, ele muda quase toda a legislação brasileira de meio ambiente.
Uma segunda questão é que, ao mudar o código, ele muda quase toda a legislação brasileira de meio ambiente.
Amazonia.org.br - O parecer altera toda a legislação ambiental?
Valente - O relatório dele flexibiliza toda a legislação, e isso está contido num artigo que acho extremamente prejudicial, que passa para os Estados a autonomia para legislar sobre meio ambiente.
Como você pode passar para os Estados delimitarem regras gerais, reserva legal e área de preservação permanente? Vou dar um exemplo. Suponha um rio de fronteira, como o rio Uruguai. Imagina que você poderia ter uma situação em que o Estado de Santa Catarina decidiria preservar 100 metros na beira do rio, enquanto, no Rio Grande do Sul, seria decidido que se pode preservar só 20. Como se explica isso, se o bioma é o mesmo?
Como você pode passar para o Estado delimitar isso? Anistiar, flexibilizar a legislação, tudo em nome da produção. Então nós somos radicalmente contrários a dar essa autonomia aos Estados, e acho que a questão de fundo do projeto é a visão que ele tem da ocupação da terra, de desenvolvimento.
Amazonia.org.br - Que visão seria essa?
Valente - O deputado Aldo Rebelo assimila a visão do Brasil exportador de commodities, de produtos primários sem valor agregado. Ele não tem a visão de que a floresta de pé hoje é muito, mas muito, mais valiosa do que derrubada para se ter pasto ou um deserto verde. Isso é uma visão extremamente nociva, porque ele não percebe que, na nossa biodiversidade, poderia se desenvolver uma megaindústria, de fármacos, de alimentos, com uma ocupação racional e sustentável da floresta.
O modelo dele é exportador, para fazer divisas e pagar juros da dívida brasileira. É disso que se trata. Ele quer acelerar isso. E para isso, está criando uma carapaça ideológica, dizendo que há uma nova invasão no Brasil. O exemplo mais simbólico disso é que, no texto do substitutivo, ele faz uma comparação entre a invasão holandesa, com as suas tropas e a implantação de uma companhia das Índias Ocidentais para exportar açúcar, com uma invasão das ONGs com sede na Holanda. Ele, inclusive, nega qualquer possibilidade de que o aquecimento global seja verídico, mesmo depois que o governo Lula estabeleceu metas em Copenhague [Convenção das Partes da ONU sobre o Clima- COP 15-, na Dinamarca, no ano passado.
Os que ele realmente defende no relatório são os grandes, os mesmos que não querem votar aqui a PEC "Proposta de Emenda Constitucional do trabalho escravo", os mesmos que são responsáveis pela devastação, pela violência no campo, e por um modelo exportador, que não permite ao Brasil utilizar a terra degradada com maior produtividade, pois está sempre pensando na expansão da fronteira agrícola.
Rigorosamente, o que o Estado tem que fazer é regulamentar o código, ser flexível com a pequena agricultura, inclusive dando apoio técnico e financeiro, e ser pedagógico na recomposição da reserva legal e de áreas de preservação permanente. Quanto aos grandes devastadores, esses sim precisam ser monitorados, ao invés de se eliminar a lei para eles.
Amazonia.org.br - O senhor acredita que é possível barrar esse relatório na Comissão?
Valente - A pressão é muito grande. Os partidos da base aliada e do setor ruralista, que é suprapartidário, exercem uma pressão muito grande, inclusive no processo de sucessão presidencial. Mas, nós já conseguimos adiar a votação em uma semana, e, para a semana que vem, eles voltaram a marcar nova reunião numa segunda-feira, dia em que possivelmente terá um jogo do Brasil. É possível que se ganhe mais tempo.
Por outro lado, há pressão do Ministério do Meio Ambiente, das entidades da sociedade civil e também da imprensa, que está tomando pé do relatório e das suas consequências, mostrando os vácuos, buracos - porque ele quer mudar uma legislação que implica impacto violento na vida social e ambiental brasileira.
Eu acredito que a gente não vota o relatório, e que a discussão pode ficar para o ano que vem. Mas, eu digo também que esse grupo ruralista é determinado, tem um objetivo corporativista muito forte, e eles têm a intenção de votar ainda neste ano. A grande vitória seria não votar o relatório na comissão até o dia 15 de julho.
Amazonia.org.br - A estratégia então é realmente postergar ao máximo essa votação?
Valente - Nossa tática é abrir o debate para a sociedade, e protelar ao máximo a votação. O deputado Aldo Rebelo declarou ao Valor Econômico que está interessado em absorver algumas críticas que foram feitas pela área ambiental. Mas na medida em que ele se identificou com o setor do ruralismo, a pressão para votar o projeto é muito forte por lá agora. Resta saber se interessa ao governo votar isso. Eu acho que não.
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