Por Correio do Brasil
Maria Inês Nassif e Najla Passos - de Carta Maior, em Brasília
Maria Inês Nassif e Najla Passos - de Carta Maior, em Brasília
Toda a direção da revista Veja envolvida com a máfia do Cachoeira |
Se depender do PT, o jornalista Policarpo Júnior, a revista Veja, a editora Abril e quantos mais profissionais de imprensa comprovadamente tiverem atuado em conjunto com a organização do bicheiro Carlinhos Cachoeira
serão chamados, a seu tempo, para depor na Comissão Parlamentar Mista
de Inquérito (CPMI) que, nessa semana, começa a revirar o esquema que
envolvia o contraventor, o senador Demóstenes Torres (GO-sem partido), o
governador Marconi Perillo (PSDB-GO) e outros políticos, e tinha
tentáculos em governos estaduais, em obras públicas federais e até no
Poder Judiciário.
Não existem, contudo, garantias de que os demais partidos da base
parlamentar do governo tomarão o mesmo rumo. E nem a certeza de que os
integrantes da comissão resistirão aos holofotes das televisões e a
embarcar na agenda que interessa à oposição e aos demais envolvidos no
inquérito da PF: concentrar os trabalhos unicamente nas atividades de Cachoeira, Perillo e Torres, e eleger a construtora Delta como única algoz dos crimes cometidos.
Também não deverá ser poupado o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que engavetou, em 2009, os autos da Operação Las Vegas,
feita pela Polícia Federal, com elementos suficientes para justificar
juridicamente a investigação do senador Demóstenes e as relações de
Cachoeira com diversas instâncias do poder público.
– É insustentável o argumento do procurador, de que aguardava o resultado da Operação Monte Carlo,
que só começou em 2011. Este é um caso de aparelhamento da estrutura do
Estado pelo crime organizado – disse um membro do PT que tem uma
posição de destaque na política nacional.
O partido também não tem a intenção de recuar para poupar o
governador do DF, Agnelo Queiroz, se for efetivamente comprovada a sua
participação no esquema: o que está em jogo vale mais do que um político
vindo do PCdoB apenas para disputar a eleição do DF, sem vínculos
orgânicos com o PT. E o Palácio do Planalto não pretende mover uma palha
para interferir nos trabalhos dos parlamentares – isto quer dizer que
qualquer pressão dos envolvidos sobre o Executivo será considerada como
um “erro de endereço”.
– O que a CPMI se propõe a investigar é uma rede de negócios montada a
partir de tráfico de influência. Seria justo julgar apenas um membro do
Legislativo por esses crimes? – indaga o líder do PT no Senado, Walter
Pinheiro (BA).
Por falta de confiança nos aliados, todavia, a ideia é não forçar depoimentos nem acusar culpas “a partir de notícias”.
– Essa comissão é diferente das outras: já existe um vasto inquérito feito pela Polícia Federal – explica Pinheiro.
Os fatos fatalmente virão a público, na medida em que os autos do
inquérito forem se abrindo aos membros da comissão. As convocações serão
feitas conforme surgirem, de forma a não expor antecipadamente os
integrantes da CPMI à pressão dos meios de comunicação.
Teoricamente, existiriam condições objetivas para levar com êxito
essa estratégia na CPMI: a base governista tem maioria e vários
integrantes foram vítimas diretas do esquema de escuta montado por
Cachoeira, da ofensiva raivosa do senador Demóstenes Torres, ou de
ambos. Na última semana, por exemplo, o líder do PMDB no Senado, Renan
Calheiros, não cansava de repetir o seu lado de história para os demais
colegas, em plenário, e para integrantes do governo Dilma.
Em 2007, em meio a um escândalo que envolvia a sua vida pessoal,
Calheiros, então presidente da Câmara, conseguiu reverter, no Senado,
uma tendência contrária à sua cassação pelo plenário da Casa. Na véspera
da votação, a revista Veja publicou escutas e a versão da ida de um
assessor do presidente do Senado a Goiás, para levantar algumas
informações de interesse partidário.
A Veja reportou e vendeu a versão de que, na viagem, o
objetivo de Francisco Escórcio era colher informações sobre o senador
Demóstenes Torres – Renan, segundo a revista, estaria fazendo isso com
vários senadores, para chantageá-los em plenário e obrigá-los a votar
contra a sua cassação. Vários senadores, que já haviam fechado com
Calheiros, mudaram o voto, argumentando que não poderia parecer à
opinião pública que estariam se curvando a um esquema de chantagem. Para
salvar o mandato, o senador alagoano abriu mão da Presidência do
Senado.
Ainda que outros senadores do PMDB tenham razões e ressentimentos
contra o esquema Cachoeira – existe a suspeita, por exemplo, de que foi o
mesmo esquema de arapongagem do contraventor que provocou o caso Lunus,
que acabou com a candidatura de Roseana Sarney à Presidência da
República, em 2002 -, os parceiros petistas não confiam inteiramente na
disposição de seus pares de comprar uma briga com a imprensa. Existem
muitos interesses envolvidos, e essa pode ser uma chance de recomposição
desses setores políticos com a mídia tradicional.
De qualquer forma, para o PT a CPMI é a porta de acesso aos autos não apenas da Operação Monte Carlo, objeto dos vazamentos que implicaram Demóstenes e Perillo no esquema Cachoeira, mas na Operação Las Vegas,
que foi entregue pela PF ao procurador-geral da República em 2009, e da
qual pouco se sabe. Seguramente, as informações dessa operação que
antecedeu a Monte Carlo trazem o tamanho da omissão do procurador-geral da República.
Ao que tudo indica, o resultado das investigações concluídas em 2009
já davam elementos suficientes para fechar o cerco em torno de
Demóstenes e Perillo. Gurgel, o procurador, no mínimo beneficiou-os com a
“cochilada”. Existe potencial para que os autos da primeira operação
atinjam um número maior de pessoas, mas Gurgel pode ser um alvo unânime
dos parlamentares.
– Tem muita gente se perguntando por que o procurador foi tão rápido
em processos que os envolviam, e tão lento nos que diziam respeito a
Demóstenes – disse uma fonte do PT.
Embora uma vastidão de interesses e ressentimentos seja um potencial
mobilizador dessa CPI, a ação de parlamentares aliados, mesmo os da
esquerda, relativizam essa possibilidade. Na semana passada, o deputado
Miro Teixeira (PDT-RJ) articulava às claras uma solução jurídica para
impedir a convocação de jornalistas e empresas de comunicação. Invocou o
artigo 207 do Código Penal, que proíbe a tomada de depoimentos das
pessoas protegidas por segredo profissional.
– Não se chama um padre para depor – argumentava Teixeira.
– Os jornalistas podem alegar essas razões para não depor, mas isso
não impede que sejam chamadas – contrapôs o deputado Cândido Vaccarezza
(PT-SP), também membro da comissão.
A outra forma de concentrar excessivamente as investigações da CPI na
Construtora Delta, do esquema de Cachoeira, foi um acordo feito entre
oposição e chamados “independentes” de “seguir o dinheiro”, também uma
proposta de Teixeira. As relações do esquema Cachoeira com a Veja, na opinião de parlamentares ouvidos pela agência brasileira de notícias Carta Maior
não necessariamente envolveram dinheiro, embora obrigatoriamente tenham
envolvido tráfico de influência, o que configura crime da mesma forma.
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